O romance político se perdeu?

Alguns romances latino-americanos ganharam notoriedade, principalmente entre os anos de 1940 e fins de 1970, por seu caráter político e abordagem de temas-problemas da sociedade em que viviam, como a corrupção, desigualdade social, racismo, autoritarismo, criminalidade, entre tantos outros.

Escritores realistas buscaram energia de suas experiências negativas e de variadas formas representaram toda a problemática de suas sociedades, partindo das dificuldades vivenciadas e em busca de soluções ou, ao menos, de levar o leitor, o cidadão a refletir um pouco sobre o desajustado mundo ao seu redor. Até mesmo escritores do chamado Realismo Mágico, conseguiram tanger a superfície do político-social em suas obras.

Há quem diga que esse tipo de literatura já morreu há algumas décadas, há quem diga que já não precisamos mais dela e outros que se sentem completamente vazios pela falta dessa abordagem e das reflexões instigadas por ela.

Escritores de nossa região que vivenciaram e participaram do boom latinoamericano, caso de Vargas Llosa, García Márquez, Júlio Cortázar e Carlos Fuentes — estes dois últimos já falecidos — demonstravam em seus textos, narrativas muito atreladas às questões sociais, políticas, morais, cotidianas.

Alguns com um caráter mais urbano, de representação das classes médias, outros um caráter mais afastado dos grandes centros urbanos ou selvático, caracterizando personagens de grupos mais humildes. Mas todos, cada um a sua maneira, nos davam um panorama político-social de sua época através das crenças, condutas, expectativas individuais ou de um grupo, características psicológicas, sociais, étnicas e culturas, além do ambiente político.

Quase todos os escritores desse grupo concordam que a Literatura, os romances, cumpriam uma função muito maior do que apenas servir de entretenimento. Ajudavam a entender as descompensações sociais, estimulavam a compreensão do leitor que algo estava errado, tirando-os da inércia diante de tanto corrupção, pobreza e desigualdade.

Mas o que mudou agora? Nossa sociedade já não precisa mais desse tipo de Literatura? Embora os escritores do boom continuem escrevendo com todo o engajamento que tinham décadas atrás, os novos romancistas se preocupam mais em entreter para ser um sucesso mercadológico, servir mais de autoajuda para os problemas pessoais do que instigar o leitor a reagir às questões sociais, econômicas, políticas que englobam o seu país?

Mas antes de jogar o peso sobre os novos escritores, precisamos refletir também o total desinteresse pelas questões políticas em nosso tempo. Cada vez mais vemos pessoas se afastarem das questões políticas, da participação ativa por dizer que a política hoje é um ambiente muito sujo e fazem questão de não se envolver, de não procurarem entender um pouco de economia, políticas sociais, etc.

Ora, para quê então escrever romances políticos se não haverá leitores para eles? É outro ponto para uma reflexão mais clara.

Há algumas respostas mais claras para as indagações do começo do texto. Sim, ainda há romances políticos, mas a maioria são autores que já faziam isso há muito tempo, com raras exceções como o escritor espanhol Javier Cercas. Se ainda precisamos desse tipo de narrativa, se ainda consumiremos esses romances é um ponto chave para o debate.

Não se fez aqui um julgamento de posições, não há como negar o benefício da leitura, mesmo que seja apenas para o entretenimento, mas são questões levantadas para pensar o futuro da Literatura, do romance e quais passos devemos seguir. Não seria melhor ao invés de excluirmos opções, trabalharmos com todas elas? É uma discussão longa, que renderia diversas teses e dissertações e ainda assim não chegaríamos a uma conclusão, mas refletir é preciso.

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