Esse não é um tema relativamente novo. Discutir os benefícios e os malefícios das traduções literárias é um debate de longa data, mas sempre em voga. Afinal, com a globalização — entre outros fatores — a quantidade de livros estrangeiros traduzidos e a rapidez com que chegam ao mercado editorial são estrondosas.
O cerne da questão está no indivíduo que traduz e a interpretação dada por ele aos textos. Por exemplo, a grande dificuldade lembrada por estudiosos da Filosofia atuais é que muito do que se tem dos filósofos da antiguidade são traduções que passaram por um processo de interpretação.
Ou, em alguns casos, o escritor do período afirmou que determinada pessoa disse aquilo, sem existir a possibilidade material, para nós, de realmente saber se aquilo foi dito.
Acrescenta-se a isso que muitas traduções portuguesas são feitas de outras traduções em língua estrangeira, ou seja, uma espécie de processo de filtragem, uma leitura da releitura, uma tradução interpretativa de outra tradução interpretativa:
Um texto dos sumérios datado de 5.000 a.C., em escrita cuneiforme, que passou por processos de transcrição, depois por uma tradução árabe, depois por uma língua européia, por exemplo, o florentino que então, mais tarde, veio a compor o italiano e, por fim, o texto foi traduzido nesta última língua. Só então, algum tradutor português conseguiu implementar a tradução. O exemplo é fictício e um pouco desconexo, mas ajuda na compreensão.
Logicamente, as questões acima são mais de cunho acadêmico. Na literatura, nos dias de hoje — ou pelo menos desde a invenção da prensa de Gutenberg –, é perfeitamente possível que você tenha acesso ao texto ou livro original que alguém tenha traduzido. Se compreendermos a língua, fica mais fácil de avaliar uma tradução para o português, ou comparar, com a finalidade de tirar pequenas dúvidas.
Mas isso nem sempre é possível. Quantos são capazes de ler em chinês, russo? Ou então, alguns textos contêm palavras e termos intraduzíveis para o português; novos elementos elaborados, enfim, algo que faz sentido apenas para a língua do escritor e precisa ser readaptado para que possamos entender e o resultado nem sempre é satisfatório. Dessa forma, estaríamos confiando na tradução e interpretação.
Em romances ou textos simples, pequenas palavras que possam receber traduções equivocadas não alteram muito o entendimento ou a percepção do leitor em relação à trama.
No entanto, em livros com técnicas narrativas mais elaboradas e complicadas, erros podem mudar a compreensão do texto, ainda que parcialmente. Embora exista a possibilidade de que cada leitor tenha a sua interpretação, mesmo com tradução de boa qualidade.
Na verdade, nenhuma tradução consegue ser 100% fiel, principalmente com o uso de gírias. A realidade é que a “era das traduções” oferece uma vasta gama de opções de textos, possibilitando que leitores em todo mundo conheçam culturas, cotidianos e relações diferentes.
Sem a tradução ficaríamos limitados a ler apenas as poucas línguas que dominamos. Pesando na balança, muito melhor com ela do que sem ela, mas todo cuidado é pouco, principalmente se você for o tradutor.