Vasos comunicantes e caixa chinesa

Costumeiramente se diz que “um romancista não vive sem técnicas narrativas”. O que de fato é verdade e bem lógico, afinal, ao colocar suas ideias no papel ele presumivelmente estará aplicando algum tipo de técnica para se fazer entender.

É também uma ação estratégia para enfatizar ou não algum ponto, tema, diálogo, ritmo, entre tantos outros, dentro de uma obra. Por exemplo, um escritor pode empregar algumas técnicas que sugerirão um ritmo veloz à história

>As técnicas narrativas não são usadas apenas por grandes escritores de romance, mas vamos nos ater especificamente a esse tipo de literato. E falar em grandes romancistas atualmente é falar de nomes como o do escritor peruano Mario Vargas Llosa.

Segundo Jorge Ninapayta, um importante analista das obras do literato, as técnicas utilizadas por Vargas Llosa são de extrema importância, pois constituem um elemento de funcionalidade em suas obras, com a intenção de diminuir a distância entre o leitor e a narração.

E assim, cria principalmente em suas primeiras obras do final dos anos de 1950 e as de 1960, um narrador cuja presença não é percebida, levando o leitor a adentrar na história e ser envolvido nas situações enfrentadas pelos personagens.

Como o título deste texto sugere, algumas das técnicas mais usadas pelo romancista peruano e que ganharam notoriedade em suas primeiras obras são os “vasos comunicantes” e a “caixa chinesa“.

Em seu livro chamado La novela, Vargas Llosa nos indica que os vasos comunicantes são na verdade uma associação dentro de uma unidade narrativa de acontecimentos, situações, temas, personagens, que acontecem em tempos e lugares diferentes. Dessa forma, o escritor associa ou funde esses acontecimentos, personagens, etc.

Agrupando tudo isso em apenas uma realidade narrativa, cada situação revelam suas tensões, suas emoções. Dessa fusão emerge uma nova experiência que vai lançar um elemento perturbador, inquietante que dará uma aparência de vida.

Pode parecer complicado lendo as palavras do escritor, mas não é, na verdade essa técnica consiste em intercalar as histórias, sem contá-las por inteiro, vão se misturando, ritmando a leitura. Não há o regrado “início, meio e fim” em conjunto, começa-se a contar uma situação aqui e sem finalizá-la, já inicia uma nova situação, em outro lugar, outra região e assim por diante, interpondo os fatos contados.

O livro A Casa Verde é uma excelente indicação de leitura para quem deseja conhecer melhor essa técnica.

As cajas chinas têm sua origem nas tão conhecidas caixinhas chinesas. Ao abri-las, sempre encontramos uma caixinha menor, outra menor e assim por diante. Ou então as chamadas matrioskas, bonequinhas russas colocadas uma dentro das outras.

Essa técnica, segundo Vargas Llosa consiste em introduzir intermediários entre o leitor e a narração, e estes vão produzindo transformações, surgindo novas experiências e tensões para que o leitor esteja sempre dentro do feitiço necessário para a plena realização de um romance na mente do leitor.

Ou seja, há uma história dentro da outra, sendo a posterior subordinada à primeira, mantendo uma relação dependente e enriquecedora, pois a totalidade do romance se engrandece com a soma das histórias. Conversa na Catedral é outro bom exemplo para verificar essa técnica.

Mario Vargas Llosa é reconhecidamente um dos gênios do romance atual. As técnicas apresentadas aqui não são as únicas utilizadas pelo escritor, aliás, já em suas obras do início dos anos de 1970 uma série de modificações vão surgindo no modo em como o escritor narra seus romances, por exemplo, uma maior presença de humor e participação do narrador durante a história, ações que não aconteciam anteriormente, principalmente esta última.

Enfim, conhecer as técnicas que um autor usa em seus textos podem aguçar nossa vontade de ler, buscar novas aspirações no mundo literário e, além disso, aumenta a nossa compreensão e ajuda-nos a desvendar as intenções de um escritor.

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Publicado por

Mateus Sacoman

Professor universitário, historiador e músico.

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